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Perdão Basta? Justiça, Fé e Responsabilidade no Brasil

30/03/2025
  • Perdão Basta? Justiça, Fé e Responsabilidade no Brasil

Em tempos de ataques à democracia, tentativas de golpe e desinformação travestida de “liberdade de expressão”, é preciso revisitar os fundamentos do Estado Democrático de Direito e da dignidade da vida pública. A recente concessão de prisão domiciliar à mulher que pichou a estátua da Justiça durante os atos golpistas de 8 de janeiro trouxe à tona uma questão fundamental: basta pedir perdão para quem comete crimes contra o Estado, a Constituição e a sociedade?

A sociedade brasileira tem direito à paz, à justiça e à verdade. E, nesse caminho, é necessário distinguir o que pertence à ordem jurídica, civil e penal — regulada pelo devido processo legal — daquilo que habita o campo da fé, do perdão e da experiência espiritual. No Brasil laico, mas de povo religioso, não raro essas dimensões são confundidas. É preciso separar com clareza o que é de César e o que é de Deus.

1. Pedido de Perdão: Gesto Ético ou Artifício Retórico?

A mulher, após pichar a estátua que representa a própria Justiça, escreveu uma carta e manifestou oralmente seu pedido de perdão ao Estado Democrático de Direito. É um gesto digno de ser acolhido enquanto atitude humana. Mas a pergunta essencial permanece: isso basta?

Num Estado regido por leis, o perdão individual, por mais comovente ou bem-intencionado que seja, não substitui o processo de responsabilização pública e legal. Pichar um símbolo institucional, em um contexto de tentativa de golpe, não é ato isolado, simbólico apenas — é uma agressão ao próprio pacto social que sustenta a democracia. A liberdade, para ser plena, exige responsabilidade, e a responsabilização penal é parte essencial da garantia de que todos sejam iguais perante a lei.

Quando crimes são cometidos contra o Estado, contra a sociedade ou contra seus símbolos, não basta um “foi mal” para reequilibrar os pratos da justiça. O pedido de perdão pode fazer parte do processo, mas não o exime da necessidade de consequências previstas em lei. Sem isso, abrem-se brechas para o populismo penal seletivo, onde alguns “arrependidos” são perdoados e outros, não.

2. Do Sacramento à Sanção: Confundir É Negar Justiça

Há quem tente aproximar o sistema jurídico brasileiro de práticas religiosas, como se o perdão pudesse servir como atenuante jurídico. Isso é uma distorção perigosa. Na tradição católica, por exemplo, o perdão não é uma simples declaração emocional. Exige contrição verdadeira, confissão explícita e satisfação — isto é, ação reparadora. Ou seja, mesmo diante de Deus, o perdão exige responsabilidade.

No direito civil e penal, a reparação de um dano à coletividade não se encerra com arrependimento verbal. Exige resposta legal, ressarcimento e, eventualmente, sanção. Aceitar o pedido de perdão como se fosse absolvição do crime é relativizar os fundamentos do Estado Democrático de Direito e fragilizar a confiança da sociedade na Justiça.

Essa confusão entre a ordem jurídica e o imaginário religioso gera um campo fértil para a impunidade seletiva — onde quem pede perdão chorando pode ser liberado, enquanto quem não se emociona o suficiente é condenado. Isso é injusto, inaceitável e afronta a própria noção de igualdade diante da lei.

3. Sem Responsabilização, a Democracia se Deteriora

Se um crime contra o Estado pode ser perdoado sem consequência, o que impede que ele se repita? Se quem promove desinformação, vandalismo e golpe contra as instituições pode pedir desculpas e seguir livre, que recado estamos passando para a sociedade?

A democracia brasileira já sofreu demais com a complacência, o revisionismo histórico e as falsas promessas de “pacificação” sem justiça. Não há pacificação sem responsabilização. Tentativas recentes de anistiar golpistas, inclusive com apoio de setores religiosos e parlamentares, mostram que a ameaça à ordem democrática segue viva e articulada.

O julgamento dos envolvidos nos atos de 8 de janeiro e de outras ações antidemocráticas não deve ser pautado por pressões emocionais ou argumentos retóricos. Deve seguir o rigor da lei, o devido processo legal e a garantia do contraditório. Mas deve ocorrer com firmeza e clareza de propósito: proteger o pacto civilizatório que nos une enquanto nação.

Um Convite à Reflexão

Liberdade sem responsabilidade é egoísmo. Perdão sem reparação é retórica vazia. Justiça sem consequências é ilusão. A sociedade brasileira precisa despertar para a gravidade dos ataques à democracia. Estamos diante de uma bifurcação histórica: punir os que atentaram contra o Estado ou abrir espaço para que outros repitam — e ampliem — os mesmos atos com maior impunidade.

A democracia não pode ser negociada. É preciso defender com coragem as instituições, fortalecer a justiça e exigir coerência. Perdão é nobre. Mas justiça é inegociável.

A você, cidadã, cidadão, cabe o dever de participar, fiscalizar, se posicionar. Nas redes, nas ruas, no voto e na vigilância permanente. Não basta torcer: é preciso agir.

Por Harlei Noro | Pensamento crítico com apoio GPT

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